ARTIGO: QUEM NÃO DEVE NÃO TEME!


(Somente os que temem a verdade querem uma imprensa censurada)

Nos últimos dias de julho passado, mais uma decisão judicial, ocorrida no Paraná, em primeira instância, deixa bem claro que o problema da censura prévia a órgãos de imprensa ganha força e a cada dia se agrava, embora o direito à livre expressão esteja consagrado na Constituição.

Segundo registros da Associação dos Magistrados Mineiros, nos últimos cinco anos já são 58 decisões (incluindo essa última do Paraná), determinando censura à imprensa, valendo acrescentar que somente no ano passado foram 11 decisões nesse sentido, conforme levantamento realizado pela Associação Nacional de Jornais (ANJ).

Para o diretor executivo da ANJ, Ricardo Pedreira, essas decisões tem se repetido com certa freqüência e mesmo sendo revogadas posteriormente, em instâncias superiores, o mal já foi feito, “porque, enquanto vigoram causam prejuízos tanto à imprensa como à sociedade, que deixa de ser informada sobre questões relevantes”, lembrou Ricardo Pedreira.

O caso recente, registrado nos últimos dias de julho e que completou a 58ª decisão de censura prévia no Brasil, nos últimos cinco anos, ocorreu contra a Gazeta do Povo, do Paraná, quando o juiz Benjamin Acácio de Moura e Costa concedeu liminar em favor do desembargador Clayton Camargo, presidente do Tribunal de Justiça daquele Estado, proibindo o jornal de publicar informações relativas às investigações que estão em andamento contra o desembargador.

Ora, ora, as investigações foram abertas por iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que em abril passado recebeu a denúncia de venda de sentença pelo desembargador Camargo numa ação que envolvia disputa da guarda de filhos, no ano de 2011, quando o desembargador atuava na área de família e a outra denúncia, mais recente, de julho passado, o CNJ mandou instaurar procedimento investigativo para a suspeita de que o Desembargador Camargo teria usado a sua influência para ajudar a candidatura do seu filho, Fábio Camargo, deputado estadual pelo PTB, a preencher uma vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná, cargo que ele obteve e do qual tomou posse em julho passado.

Evidentemente, tanto o primeiro caso (suposta venda de sentença), como o segundo (uso de influência para tornar o filho conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná), ainda estão sob investigação, mas se baseiam em suspeitas sólidas, a ponto do CNJ determinar a apuração, o que indica que não é fruto de mera especulação do jornal, ou seja, não é o jornal Gazeta do Povo que está levantando as sólidas suspeitas e, sim o próprio Conselho Nacional de Justiça, órgão de controle e repressão de desvios de condutas de magistrados (de juízes).

Recorrer à justiça para obter decisão liminar em seu favor, sendo o próprio suspeito o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado, já sinaliza e faz crescer a suspeita levantada nos dois casos que estão sob investigação, porque, se ele não deve, não tem o que temer, e somente os que temem a verdade querem uma imprensa censurada.

A sua posição mais coerente, com a ética, a moralidade e a transparência exigidas pelo exercício da posição de juiz-chefe dos juízes do seu Estado, obviamente, seria afastar-se do cargo de Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná e se declarar publicamente disponível para colaborar com as investigações, para que tais suspeitas não afetassem a sua honra. Preferiu, entretanto, agir ao contrário, calando a imprensa de cumprir o seu dever constitucional de manter a sociedade informada.

Segundo o site JusBrasil, quem mais uma vez colocou o problema em seus devidos termos, e com a clareza habitual quando trata de direitos, foi o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto, que chamado a se manifestar sobre o caso, disse: “Pessoalmente, entendo que a liberdade de imprensa é, antes de tudo, liberdade de informação. Assim, tudo o que for veículo de informação deveria estar a salvo de qualquer censura”. E recordando manifestação do ex-presidente do STF, Ayres Britto, a respeito deste novo caso, ele disse: “Não há no Brasil norma ou lei que chancele poder de censura à magistratura”, isto é, não existe norma ou lei que proteja um magistrado de ter informações publicadas a respeito de eventuais condutas impróprias praticadas. Tanto faz ser juiz (mesmo desembargador) como o cidadão comum, se praticou conduta reprovável, a sociedade tem o direito de ficar sabendo.

O mais preocupante nessa questão, segundo publicação da Associação de Magistrados Mineiros, “é que não estamos diante de casos isolados de decisões judiciais infelizes. Seu número é crescente. Uma das primeiras grandes vítimas desse tipo insidioso de censura prévia foi, como se sabe, o Estado (Jornal Estado de São Paulo), proibido desde julho de 2009 de publicar notícias com base nas investigações feitas pela Polícia Federal, dentro do quadro da chamada Operação Boi Barriga, a respeito de possíveis ilícitos praticados pelo empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney”.

Fatos como esses só contribuem para mancar a imagem do Brasil no exterior, além do que, no ranking da liberdade de imprensa, referente ao ano de 2012, divulgado pela ONG Repórter sem Fronteira, a posição brasileira piorou ainda mais, passando da posição 99 para a posição 108.

Diante disso, pertinente é a pergunta da Associação de Magistrados Mineiros: “O que esperam os tribunais superiores para pôr fim a esse atentado a um dos princípios básicos da Constituição”.


*Josemar Santana é jornalista e advogado, integrante do Escritório SANTANA ADVOCACIA, com unidades em Senhor do Bonfim (Ba) e Salvador (Ba).
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