ARTIGO: REVISTA ÍNTIMA DE MULHERES ESTÁ PROIBIDA

Josemar Santana

(Senhor do Bonfim, Bahia, 24 de abril de 2016).

Desde o dia 15 deste mês de abril que a revista íntima de mulheres está proibida no Brasil, com a entrada em vigor da Lei Nacional nº 13.271, que veda a prática em presídios e empresas públicas e privadas, ou órgãos e entidades de qualquer espécie.

Tida como uma grave violação à intimidade e grande desrespeito à dignidade da pessoa humana, a revista íntima feminina sempre foi combatida pelos órgãos e entidades de defesa dos direitos humanos.

Apesar dessa defesa constante e vigorosa, a sustentação da prática da revista íntima de mulheres tinha sua principal sustentação (e ainda tem) como sendo uma necessidade para a prevenção de uso de mulheres para o transporte de drogas, celulares e outros objetos proibidos para dentro de presídios.

Enquanto, nas empresas públicas e privadas e órgãos e entidades de qualquer espécie, a prática é sustentada na necessidade de prevenção contra furtos e apropriações indevidas de ordem patrimonial, muito comum em supermercados e lojas de departamentos em geral.

Para a realização da revista íntima feminina a mulher deveria ficar nua, se agachar ou saltar para possibilitar ao agente da revista a identificação de qualquer objeto escondido dentro do corpo, além do que, cães farejadores também eram muito usados, como lembram os advogados Leonardo Lélis e Brenno Grillo em recente comentário sobre a referida lei, publicado na Revista Eletrônica Consultor Jurídico, edição de 19/04/2016.



Na verdade, não existia norma autorizadora da revista íntima de mulheres, existindo, ao contrário, expressa proibição contida em Resolução de nº 5, do ano de 2014, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, e, principalmente, o argumento de que a prática feria a preservação da dignidade humana e da intimidade, valendo lembrar que a Lei Nacional nº 10.792/03, em seu artigo 3º, prevê apenas o uso de detector de metais para a realização desse tipo de revista em qualquer pessoa (não só as do sexo feminino) que tenha interesse de entrar em estabelecimentos penais.

Para evitar o constrangimento a que é submetida a mulher, há quem defenda o uso de “scanners” corporais instalados nos presídios e que exigem salas especiais, com temperatura inferior a 38 graus Celsius, devendo, nas empresas privadas e órgãos e entidades outras, utilizarem-se os detectores de metais, mais baratos e acessíveis, apesar de menos eficientes do que os “scanners” corporais, que identifica qualquer objeto estranho ao corpo da pessoa revistada.

Já o delegado da Polícia Civil do Paraná (colunista da Revista Consultor Jurídico), Henrique Hoffmann, apesar de reconhecer que o uso de “scanners” corporais é medida ideal, sustenta que no momento não é possível excluir totalmente a revista íntima como recurso de segurança nos presídios.
Lembra o delegado Henrique que inexiste lei nacional proibindo a prática nas cadeias e que o Código de Processo Penal permite buscas, conforme dispõem os seus artigos 240 e 244, lembrando que “a intimidade não é direito absoluto”, podendo diante da necessidade de garantir a segurança pública, dar lugar à revista íntima feminina.

O delegado Henrique vai mais além à sua avaliação e diz que o preâmbulo da norma “deixa claro que o legislador quis proibir a revista íntima apenas nos locais de trabalho, permitindo nos ambientes prisionais, embora com restrições”, acrescentando que o texto original da nova lei “trazia um dispositivo que excluía os presídios desse impedimento, mas o conteúdo foi vetado”.

Segundo sua avaliação, o Poder Executivo, ao vetar o dispositivo, exercendo o seu controle preventivo de constitucionalidade, “quis evitar a edição de norma expressa autorizando a busca pessoal minuciosa nos presídios”.

Por sua vez, a advogada Maísa Fernandes, que já presidiu o Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro (aliás, o Rio de Janeiro aprovou lei proibindo a revista íntima muito antes da entrada em vigor da Lei Nacional 13.271/2016), mesmo considerando a norma uma boa iniciativa, acredita que o melhor será aprovar o Projeto de Lei 7.764/2014, “que trata diretamente do tema”.

Maíra lembra que muitos estados e cidades dispõem de leis, portarias ou decisões judiciais impedindo a revista íntima, destacando entre eles, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Amazonas e Recife, ressaltando que o veto ao artigo 3º da Lei 13.271/2016, que permitiria a revista íntima em presídios como um avanço, porque, aí, o legislador evitou exceções.

Para o professor da USP (Universidade de São Paulo), Gustavo Garcia, mesmo entendendo que o empregador possui o chamado “poder de direção”, seu uso é limitado para coibir abusos, estando, entre esses abusos, a revista íntima, citando como mecanismos legais para inibir os chamados excessos, os artigos 187 do Código Civil de 2002 e o artigo 8º da Consolidação das Leis do Trabalho.
Gustavo Garcia lembra que esse entendimento pode muito bem ser aplicado aos homens e explica que “a revista íntima, no caso, é a que viola justamente o direito de intimidade do empregado” e não se confunde com a revista pessoal, sem contato físico como em bolsas e pertences do empregado, já que é exercida “de modo impessoal, generalizado e não abusivo”, isto é, sem violar a intimidade do trabalhador.

Percebemos, aí, que a Lei Nacional 13.271/2016 (vale para todo o território nacional, em todos os âmbitos, enquanto a Lei Federal vale apenas no âmbito da administração federal), da forma como entrou em vigor, está gerando divergências entre os doutrinadores do direito e reabre o debate sobre segurança, o que leva o professor Gustavo Garcia a ponderar que a citada lei, “por ter alcance restrito às mulheres sem justificativa plausível, pode ter a sua constitucionalidade discutida”.

E ele diz isso sustentando a sua ponderação na observação de que a “norma legal não deveria restringir a proteção considerando o sexo da pessoa”, entendendo que o mais adequado seria corrigir a apontada desigualdade, estendendo a proibição de revista íntima a todas as pessoas, independente do sexo.

Afinal, é a Constituição que diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, seja de raça, cor, gênero, crença etc., porque “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, nos termos constantes da nossa Carta Magna (art. 5º e incisos).

*Josemar Santana é jornalista e advogado, integrante do Escritório SANTANA ADVOCACIA, com unidades em Senhor do Bonfim (Ba), Salvador (Ba) e Brasília (DF).
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